Uma grande dificuldade
que os pais têm é lidar com o filho ideal e o filho real. Se deparar com o
filho real é muito difícil e os pais insistem que a criança chegue o mais perto
possível do filho ideal.
Pais que idealizam um filho estudioso, mas que na
realidade não gosta de estudar, pais que idealizam um filho generoso, mas que
na realidade é egoísta, pais que idealizam um filho obediente, mas que na
realidade é desafiador, pais que devem lidar com o descompasso do ideal com o
real.
Conversando com os pais, percebo muitas vezes, que na
verdade, a queixa que formulam sobre os filhos é mais um incômodo para eles do
que para a própria criança ou adolescente. Dizem: “ele não gosta de estudar”,
“ele é desorganizado”, “ele não aceita regras”, “ele não faz a lição”. Diante
da queixa dos pais, sempre me questiono, esta queixa legitima uma psicoterapia
ou esses pais querem que eu transforme essa criança no filho ideal? É claro que
boa parte da resposta para esse questionamento é a criança que nos oferece,
revelando seu real sofrimento, muitas vezes, ela não se identifica com a queixa
dos pais.
Os pais têm a difícil missão de entender que aquela
criança não é uma extensão deles, não é um braço ou uma perna deles, aquela
criança é um sujeito em devir, é um homem ou mulher em formação e isso não é
ruim nem bom, isso é apenas prova de que aquele pequeno sujeito já dá mostras
de sua individualidade.
A função dos pais é, sobretudo, educar esse pequeno ser
para que possa dar conta de sua vida adulta, mas isso não significa que nesse
processo a criança irá fazer tudo igual aos pais, tudo da forma que esperavam.
Muitas vezes, as crianças revelam aos pais, o furo que há
neles mesmos. Um furo que eles passaram a vida toda tamponando, mas que agora,
com a presença do filho, não tem como esconder, pois o filho insiste em mostrar
que ele não consegue corresponder ao que os pais esperam dele e, na maioria das
vezes, essa é a reação mais saudável que a criança pode oferecer.
A tarefa de aceitação e acolhimento da personalidade e
individualidade do filho, reconheço, não ser nada fácil. Principalmente no
momento em que eles entram na adolescência e que, de fato, passam a fazer
escolhas, essa questão se torna ainda mais conflitava. Porém, é muito mais
saudável ter filhos que fazem escolhas, mesmo que diferentes da sua, ou até
mesmo equivocadas, do que filhos que simplesmente não escolhem, que se
paralisam diante da vida, que não tomam iniciativas, e que permanecem
dependentes de seus pais.
Atendo alguns adolescentes que sofrem muito com esse
momento de desligamento dos pais. Não conseguem caminhar com as próprias
pernas, têm muito medo de contrariar, não arriscam fazer escolhas. Sofrem muito
por isso, sofrem muito em imaginar que a vida adulta se aproxima e que eles
terão que viver suas vidas sem tutela, por sua própria conta e risco. O medo os
apavora, o medo causa um verdadeiro estado de fobia e paralisia. Têm ataques de
pânico, medo de sair de casa, medo de ficar em público, medo de viver suas
próprias vidas.
Sabemos que, como pais, fizemos nosso melhor papel,
quando podemos vislumbrar nosso filho dando conta da própria vida, assim
podemos ter certeza, que fizemos nossa parte, tudo deu certo. Mas, para que
tudo dê certo, cabe a nós, aceitar o fato de que a criança será um adulto, o adolescente
deve fazer escolhas para que a vida adulta possa ser realizada e feliz. Feliz
para ele, não para você.
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