Na maioria dos
encaminhamentos de crianças para atendimento psicológico, feito pela escola, a
falta de concentração é um dos destaques ao lado da agitação. Muitos relatórios
destacam que a criança não consegue se concentrar, tem pressa para fazer a
lição, e não consegue realizar as atividades até o final.
O que acho mais interessante nessas queixas, é que os
profissionais da escola relatam a concentração de forma tão simples, que parece
muito fácil ser adquirido. Você acha fácil se concentrar? Quando você está
lendo um texto de difícil entendimento e interpretação você consegue apreender
imediatamente o sentido do texto? Você faz isso rapidamente? Ou quando você
percebe seu pensamento já percorreu todos os lugares e se distanciou,
absolutamente, do texto?
Pois é, a concentração não é algo simples a ser
adquirido. Se concentrar é difícil e exige esforço, um tremendo esforço,
principalmente para uma geração que pouco precisa exercer essa habilidade, pois
a vida moderna está muito mais volátil. As informações mudam numa velocidade
alucinante, por influencia da internet.
Quando eu era criança para fazer um trabalho escolar, ou
eu me utilizava das duas coleções de enciclopédias disponíveis na minha casa,
Barsa e Mundo da Criança, mas devido às informações restritas, o mais comum era
que eu recorresse a uma visita à biblioteca municipal. Na minha época ter uma
carteirinha da biblioteca era obrigatório, uma hora ou outra, necessitávamos
recorrer aos inúmeros livros disponíveis por lá. Normalmente a bibliotecária
separava vários livros com o tema a ser pesquisado e cabia a nós, ler partes
dos livros, fazer um resumo de cada parte, anotar todas as referências e depois
compor um texto com todas essas informações. Podemos afirmar que fazer um
trabalho de escola era um bom exercício de concentração. Para fazer um trabalho
escolar, hoje em dia, encontramos as informações absolutamente acessíveis na internet,
nem precisamos sair de casa.
Com esses argumentos, não quero dizer que a internet é
uma ferramenta negativa. Ao contrário, acho que a tecnologia está disponível
para facilitar nossas vidas e não quero ter um discurso saudosista em que
valorizo o passado em detrimento ao presente. Porém, não posso negar que as
mudanças têm efeitos sobre a subjetividade, efeitos sobre como as pessoas agem
e se comportam. Em um percurso histórico sobre o papel social da criança já
podemos notar que em cada período histórico a criança tinha uma função
distinta. Sem sombra de dúvidas a vida moderna oferece um grande destaque para
a criança, em que ela passa a ser objeto de questionamentos e pesquisas.
O comportamento infantil vem sendo alvo de estudos
constantes e tem transformado a criança em um laboratório experimental, o que
faz com que o comportamento infantil sempre tenha uma classificação.
O que pretendo chamar atenção é que a criança é efeito de
um tempo social, efeito de sua família e também da relação com a escola. A
criança é um ser imaturo, em desenvolvimento, e certas classificações ainda são
muito precoces para um ser que ainda tem muito a aprender e apreender, tanto
emocionalmente, quanto cognitivamente.
Por isso, pais e professores, cuidado! Cuidado para não
cair na tentação de classificar seu filho e/ou aluno. Cuidado para não ter que
sempre encontrar uma justificativa para o comportamento da criança. A criança
não nasce sabendo, não nasce com as habilidades necessárias. Ela precisa se
desenvolver, aprender e principalmente receber a ajuda de um adulto, de uma
pessoa mais madura e com maiores habilidades do que ela.
Que possamos proteger, ajudar e orientar mais nossas
crianças e classificar, diagnosticar e enquadrar menos. Que as crianças possam
ser cada vez mais crianças. Que possam brincar e que tenham o direito de não
conseguir, de sentir dificuldade, de não conseguir se concentrar. Cabe a nós, adultos,
ajudá-las nesse sentido e ajudar não é, definitivamente, classificar.
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