terça-feira, 3 de novembro de 2015

Sobre a cena do menino que destruiu a escola

         Na semana passada nos deparamos com um vídeo nas redes sociais, em que uma criança destruía a sala de aula, enquanto professores e funcionários da escola filmavam a cena. Achei, particularmente, a iniciativa de filmar a criança, absolutamente inadequada, pior ainda, disponibilizar este vídeo na internet, expondo o aluno em questão, porém já que a cena está viralizando na internet, achei por bem comentá-la.
            Gostaria de destacar alguns pontos dessa cena. Os professores pareciam filmar, como forma de adquirir uma prova do comportamento inadequado do aluno. Este ponto me chamou muita atenção. Como profissionais que, teoricamente estão preparados para lidar com crianças, simplesmente se paralisam diante de uma situação em que a criança está em “surto”? Por que ninguém pode conter a criança até que ela se acalme? Por que ninguém pode segurá-la e aos poucos, conversar com ela? Por que ninguém pode tentar intervir diante dessa situação? Eu mesma já contive diversas crianças em situação institucional. Muitas vezes, as crianças não sabem como lidar com algumas situações, porém, nós adultos e profissionais que trabalhamos com crianças, devemos estar preparados para tratar com esta demanda. Não lidamos só com crianças boazinhas, educadinhas, quietinhas e comportadas, devemos estar disponíveis para tratar com todo tipo de criança e as situações que podemos enfrentar no dia a dia, podem ser as mais inusitadas.
            Outro questionamento é: por que essa criança fez isso? Por que ela teve esse comportamento agressivo e violento? A partir dessas questões me deparei, nas páginas sociais, com diversas publicações com teorias que justificavam o comportamento do garoto, o que considero um absurdo, simplesmente, porque não sabemos porque ele fez isso e não podemos saber, até ouvir a criança e seus familiares. Teorias sobre o fato de que o aluno cometeu essa ação porque sofre violência dentro de casa e que, por consequência, o seu comportamento tem relação com essa violência, é simplesmente algo que não podemos afirmar. Teorias sobre o fato de que essa criança não tem educação em casa e será um futuro “bandidinho” também é precipitada, pois, estamos condenando uma criança que nem mesmo conhecemos.
Não sabemos o que esse garoto vivência e criar uma suposição para isso é simplesmente desconsiderar a escuta do menino e da família, o que acredito ser um ato preconceituoso e cheio de julgamentos. O que vejo no cotidiano das escolas e instituições que atendem crianças, são julgamentos do tipo: se essa criança se comporta assim é porque ela passa por isso, ou por aquilo, é porque a família dela é assim, ou assado.
Os que julgam que compreendem as crianças e se dizem defensores dos direitos das mesmas, ao analisarem a situação dessa criança e determinarem que o comportamento dela tenha relação com uma dada situação, que ela vivência em casa, estão sendo absolutamente precipitados.
Não descarto a possibilidade de o menino viver em um contexto de violência, não só em casa, assim como na comunidade em que está inserido. Já tive a oportunidade de trabalhar em uma instituição que atendia crianças e adolescentes em situação de rua, o que me lembrou muito o comportamento desse garoto. Os meninos dessa instituição não tinham noção de limite e respeito, pois, eles viviam na rua e a rua é um espaço público e livre, teoricamente, eles poderiam circular livremente nesse espaço. Já na instituição, tinham regras e limites e, muitas vezes, quando não concordavam com as regras, destruíam o que viam pela frente, frequentemente, tínhamos que contê-los. Porém, conseguíamos estabelecer, aos poucos, uma relação de confiança e reciprocidade, mas para isso acontecer, tínhamos que fazer uma aposta naquela criança, tínhamos que dar uma oportunidade para ela, tínhamos que ter paciência.
Outra possibilidade pode ser que a criança não viva em uma situação de falta (violência doméstica, ausência dos pais, descaso, abandono e outros tipos de negligência), mas uma situação de excesso (pais permissivos, que não impõem limites, que disponibilizam para a criança o que ela quer, no tempo que ela deseja).
Qual dessa situação fazia parte do contexto desse garoto? Ou será que não é nenhuma delas, mas alguma outra que não pude citar, por fazer parte do ambiente privado da família, ou até mesmo por fazer parte do âmbito institucional da escola, afinal, outro ponto a ser analisado nessa cena seria a relação do aluno com a escola.
Não podemos pré-julgar um comportamento de uma criança sem ouvi-la, sem conhecer o contexto que ela está inserida, sem conhecer a história de sua família.
As crianças não precisam ser julgadas, mas sim ouvidas. Mesmo quando a situação de pré-julgamento parece ser bem intencionada e politicamente correta.




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